O Antigo Testamento utiliza duas formas diferentes do mesmo termo
hebraico (hidsdik e tsiddek) para expressar o conceito de
justificação. Esses termos, exceto em algumas passagens, não
indicam uma mudança moral operada por Deus no homem, mas
regularmente designam uma declaração divina a respeito do homem.
Transmitem a idéia de que Deus, em sua qualidade de juiz, declara o
homem justo (Dt 25.1; Pv 17.15; Is 5.23; Sl 143.2). O termo do Novo
Testamento (dikaio-o) tem o mesmo significado, isto é, declarar
justo (Rm 3.20-28; 4.5-7; Gl 2.16; 3.11; 5.4; Rm 8.33,34; Jo 3.18;
5.24; 2 Co 5.19). Entende-se, pois que o termo “justificar” não
significa fazer, mas declarar justo.
1. A Natureza e as
Características da Justificação
Por “justificação”,
entende-se o ato pelo qual Deus declara posicionalmente justa a
pessoa que a Ele se chega através da pessoa de Jesus Cristo. Esta
justificação envolve dois atos: o cancelamento da dívida do pecado
na “conta” do pecador, e o lançamento da justiça de Cristo em
seu lugar. Tornado-se mais claro: justificação não é aquilo que o
homem é ou tem em si mesmo, mas aquilo que o próprio Cristo é e
faz na vida do crente. “Sendo justificados gratuitamente pela sua
graça, pela redenção que há em Cristo Jesus, a quem propôs, no
seu sangue, como propiciação, mediante a fé, para manifestar a sua
justiça, por ter Deus, na sua tolerância, deixado impunes os
pecados anteriormente cometidos; tendo em vista a manifestação da
sua justiça, no tempo presente, para ele mesmo ser justo e
justificador daquele que tem fé em Jesus (Rm 3.24-26). “Não se
deve confundir justificação com regeneração. A justificação tem
lugar fora de nós, junto ao trono de Deus, onde Ele nos declara
justos. É, pois, coisa objetiva. A regeneração é obra divina
operando em nosso interior. É por isso, subjetiva. A justificação
é o veredito de Deus, e a regeneração é uma experiência humana.
A justificação é o que Deus faz por nós; a regeneração é o que
Deus faz em nós. A justificação muda a nossa posição, ou
situação; a regeneração tem a ver com o nosso estado. A
justificação muda a nossa relação para com Deus; já a
regeneração muda a nossa “natureza” (Os Oitos Pilares da
Salvação – Editora Betânia – Pág. 74).
2. Elementos da
Justificação
Existem
especialmente dois elementos na justificação, um negativo e outro
positivo.
a) O Elemento
Negativo
O elemento negativo
da justificação é o perdão dos pecados com base na justiça
imputada por Cristo. O efeito produzido pelo ato da justificação se
aplica a todos os pecados passados, presentes e futuros por isso
incluem a libertação de toda a culpa e castigo. Isto acontece
devido ao fato de que a justificação não se pode repetir (Rm 5.21;
8.1,32-34; Hb 10.14; Sl 103.12; Is 44.22).
b) O Elemento
Positivo
O elemento positivo
da justificação se distingue em duas partes: primeiro a adoção de
filhos e segundo o direito a vida eterna. Pelo processo da
justificação Deus adota o crente como seu filho, conferindo-lhe
todas as regalias decorrentes dessa filiação. Esta filiação por
adoção deve ser distinguida da filiação moral dos crentes que
resulta da regeneração e santificação. Deste modo os crentes são
filhos de Deus, não apenas em decorrência da adoção, e portanto
num sentido jurídico, mas também em virtude do novo nascimento,
conseqüentemente num sentido espiritual (Manual de Doutrina Cristã
– Editora Luz Para o Caminho e Ceibel – Págs. 232,233). Já o
direito à vida eterna está virtualmente incluído no elemento
precedente. Quando os pecadores são adotados como filhos de Deus,
tomam posse de todos os direitos legais de filhos, e se tornam
herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo (Rm 8.17). Constituem-se
herdeiros de todas as bênçãos da salvação na vida presente, e
além dessas recebem o direito a “herança incorruptível, sem
mácula, imarcescível, reservada no céu” para eles (1 Pd 1.4).
3. Obtenção e
Conservação da Justificação
Os efeitos da
justificação pela fé abrangem a totalidade da vida do crente. No
passado, a fé justificou-o, libertando-o inicialmente da condenação
do pecado. No presente, a fé continua a justificá-lo, libertando-o
da prática do pecado. Na medida em que ele continua na fé, a
justificação do crente culminará na glorificação, libertando-o
para sempre da presença do pecado. “Desde o momento da conversão
até o fim da vida terrena, a justificação é sempre a mesma. O
crente poderá necessitar de perdão como filho do Pai, mas nunca
mais será considerado criminoso perante o Juiz. A justificação é
o ato de juiz; o perdão é o ato de pai. A justificação abrange o
passado, presente e o futuro. A questão do pecado, entre a alma e
Deus, foi resolvida para sempre. É possível o crente ser um filho
desobediente, e assim necessitar da vara de castigo do Pai, mas nunca
mais pode ser considerado pecador perdido e sujeito à condenação
do Juiz” (A Doutrina da Salvação – EETAD – Pág. 70).
4. Os Benefícios da
Justificação
A justificação não
é uma experiência, é uma declaração legal de justiça, só
possível mediante um relacionamento com Cristo. Esta declaração
traz inúmeros benefícios à vida do crente justificado, entre os
quais se destacam os seguintes:
a) Um Novo
Relacionamento com a Lei
A justificação
concede ao crente uma nova posição em relação à Lei de Deus. Uma
vez que a lei divina exigia obediência como condição de o homem
obter a vida eterna (Rm 8.3,4), e como o homem jamais foi capaz de
cumprir inteiramente com as exigências divinas neste sentido, em vez
de abolir a lei, Deus enviou Jesus Cristo para cumprir-la por nós
(Mt 5.17). Deste modo, por meio de Jesus Cristo, “todo o que crê é
justificado de todas as coisas das quais vós não pudestes ser
justificados pela lei de Moisés” (At 13.39).
b) Um Novo
Relacionamento com Deus
Mediante a
justificação, a separação existente entre Deus e o homem por
causa do pecado, é abolida através de Jesus Cristo, e transformada
em “paz com Deus”. A ira de Deus é traduzida em benignidade,
legal e completamente. “Justificados, pois, mediante a fé, temos
paz com Deus, por meio de nosso Senhor Jesus Cristo... Logo, muito
mais agora, sendo justificados pelo seu sangue, seremos por ele
salvos da ira” (Rm 5.1,9).
c) Uma Nova
Concepção da Culpa Pessoal
Mediante a
justificação, o crente é uma pessoa livre do peso da culpa pessoal
(Rm 5.1). No que pesem as lembranças dos pecados de outrora, e as
acusações por parte do Diabo, o crente se mantém confiante na
provisão justificadora de Deus em seu favor na pessoa de Cristo.
Deste modo “quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É
Deus quem os justifica. Quem os condenará? É Cristo Jesus quem
morreu” (Rm 8.33). Independentemente do pecado outrora cometido,
todo ele foi absolvido pela obra meritória de Jesus no calvário.
“Quanto está longe o oriente do ocidente, assim afasta [o Senhor]
de nós as nossas transgressões” (Sl 103.12).
d) Uma Nova
Concepção do Futuro
A justificação tem
o duplo mérito de nos liberta tanto da culpa do passado quanto dos
temores do futuro. Uma vez justificado por Deus, o crente pode saber,
nesse exato momento, que é salvo. Ele não precisa esperar até à
consumação dos séculos, para ver se foi “suficientemente bom”
para merecer a salvação. O crente encara com confiança o futuro,
sabendo que, a qualquer momento, poderá entrar na presença de Deus,
purificado de todos os seus pecados e vestido com as vestes da
justiça do Cristo. “A fim de que, justificados por graça, nos
tornemos seus herdeiros, segundo a esperança da vida eterna” (Tt
3.7). “Porque me cobriu de vestes de salvação, e me envolveu com
o manto da justiça” (Is 61.10).
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